Pular para o conteúdo principal

Teatro no Paraná recebe nome de deputado que apoiou a ditadura; artistas repudiam

Teatro municipal da cidade de Assis Chateaubriand receberá nome do ex-deputado Moacir Micheletto

Ana Carolina Caldas

Brasil de Fato | Curitiba (PR) | 24 de Junho de 2022 às 18:24

Teatro recebeu o nome de político que foi filiado à Arena, partido de sustentação do regime militar - PREFEITURA MUNICIPAL DE ASSIS CHATEAUBRIAND


O dia nesta sexta-feira (24) deveria ser de festa para a cultura na cidade de Assis Chateaubriand, interior do Paraná, com a inauguração do teatro municipal da cidade. Porém, o espaço cultural, que teve investimento de R$ 10 milhões, receberá o nome do deputado federal Moacir Micheletto, defensor da ditadura militar.

Artistas e entidades que representam o setor cultural paranaense destacam a importância do teatro, porém repudiam que o lugar receba o nome de um politico que nada fez pela arte e que foi defensor da ditadura. Micheletto morreu em 2012.

“O Moacir Micheletto tem em seu currículo o apoio à ditadura militar que matou centenas de pessoas, entres essas, artistas. Dar um nome de um teatro, que é uma casa sagrada para os artistas e um local de representação humana, é algo indigno com o próprio teatro”, diz Raquel Rizzo, presidente do Sindicato dos Artistas e Técnicos em Espetáculos de Diversões do Paraná (Sated-PR).

Em seu currículo, Moacir Micheletto conta com a filiação à Aliança Renovadora Nacional (Arena), partido de sustentação do regime militar instalado no país em abril de 1964.

Denúncia ao Comitê da Memória, Verdade e Justiça

Para atriz Nena Inoue, que viveu sua infância na cidade de Assis Chateaubriand e lá começou a fazer teatro na escola, a notícia é revoltante.

“Eu fiquei muito feliz quando soube da inauguração. Mas quando vi que o local receberia o nome de um deputado, achei um absurdo. Isso não faz sentido para um teatro. Como é que a gente homenageia um cara que apoiou a ditadura e nada fez para a cultura?", questiona.

Além do apoio à ditadura, a atriz destaca que, entres as ações do deputado, esteve a proposta de diminuição de reservas da Amazônia. Como deputado federal, em 1998, Micheletto apresentou a proposta de alteração no Código Florestal que reduzia de 80% para 50% o percentual de preservação ambiental obrigatória em propriedades situadas na Floresta Amazônica, e de 50% para 20% a mesma reserva legal na região do cerrado.

“É um homem que nunca fez nada pensando no bem estar das pessoas", pontua Nena Inoue. A atriz ainda informou que pretende levar a denúncia da homenagem a um apoiador da ditadura ao Comitê Estadual da Memória, Verdade e Justiça do Estado do Paraná, entidade responsável por acolher e denunciar crimes cometidos sob o regime militar.

Teatro não é patrimônio de políticos

Para representantes dos artistas no Paraná, dar a um teatro, que é um bem público, o nome de um político é querer patrimonializar a arte e a cultura.

“Não é a primeira vez que o Paraná disputa simbolicamente a nominação de um teatro. Lembremos que o atual Teatro Guaíra se chamava anteriormente de São Teodoro, que era o Ébano Pereira, mas os artistas e a cidade queriam outro nome, que representassem o Paraná anterior à ocupação europeia. Posteriormente, recebe o nome de Guaíra, nome da antiga província que hoje vem a ser o Paraná”, lembra Gehad Ismail Hajar, presidente do Sindicato dos Empresários e Produtores em Espetáculos do Paraná (Seped-PR).


A atriz e diretora de cinema Maria Fanchin, que nasceu na cidade e atualmente mora em São Paulo, recebeu a notícia com indignação.

“O teatro é público, um bem da população e, portanto, não é um patrimônio privado da família Micheletto. A família não está fazendo caridade dando um teatro para a cidade. Ter teatros na cidade é uma obrigação dos políticos e do poder publico”, diz.

Homenagem à "luta incansável" pelo teatro na cidade

A redação do Brasil de Fato Paraná entrou em contato com a Prefeitura de Assis Chateaubriand a respeito das manifestações dos artistas. Até o fechamento da matéria, não houve retorno.

No site da prefeitura consta, no entanto, uma explicação sobre a homenagem. De acordo com a prefeitura, o nome do Teatro Municipal “é uma homenagem por conta da luta incansável do então deputado federal Moacir Micheletto em construir um teatro municipal em Assis Chateaubriand."

O texto do site explica que o filho do deputado, Marcel Micheletto, enquanto prefeito do município, "incansavelmente foi atrás de verbas para a conclusão do que é um dos maiores teatros do Paraná."

"Foram aproximadamente R$ 10 milhões de reais em investimentos. Sendo as três últimas etapas com valores robustos para a parte de finalização da obra, foram mais de R$ 7 milhões”, aponta o texto da prefeitura.

Postagens mais visitadas deste blog

Curitiba já foi capital do Brasil e é mais antiga do que se imagina (Matéria do Jornal Comunicação On-line - UFPR)

Pesquisadores revisitam a história da cidade e apontam fatos históricos desconhecidos pela população Reportagem: Felipe Nascimento Edição Renata: Portela Responda a seguinte pergunta: quais cidades foram capitais do Brasil? Um bom estudante de história responderia Salvador, Rio de Janeiro e Brasília. Mas o que poucos sabem é que Curitiba já foi oficialmente capital brasileira. Esse é somente um dos fatos históricos pouco conhecidos sobre a cidade apontados por dois pesquisadores da história do Paraná. Gehad Hajar, membro do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná, é um desses pesquisadores.  Ele está realizando a pesquisa “Curitiba: de povoado à capital do Brasil”, que deverá ser lançada em livro no segundo semestre de 2011. A cidade foi capital federal entre 24 e 27 de março de 1969, época em que vigorava a ditadura militar. De acordo com o pesquisador, a mudança foi por uma questão propagandística. “Curitiba era uma das capitais brasileiras que não

Apresentação do livro "Monumentos de Curitiba" - 2° edição

Apresentação Há muito sentia-se falta de um inventário do patrimônio artístico e cultural nos logradouros e próprios públicos do Município de Curitiba.  Ei-lo: Monumentos de Curitiba, nossa pesquisa de mais de uma década, em que corremos a campo, percorrendo ruas, praças e prédios a fim de elencar, catalogar e fotografar as hermas, bustos, placas, monólitos, estátuas, fontes, repuxos, relógios, árvores preservadas, monumentos, obras de arte, enfim, tudo que esteja exposto publicamente e agregue valores culturais e históricos à memória da cidade.  No afã de ajudar em futuros estudos, restaurações, reposições, manutenções e análises, as fichas tendem a trazer informações mínimas, padronizadas e necessárias, acompanhadas de fotos dos principais bens. Nossa coleção pública é valiosa. Temos desde o monólito do séc. XVII de posse portuguesa sobre este território, na praça Tiradentes; a última argola de atracamento de cavalos do séc. XVIII, na rua de São Francisco; o primeiro

Vida e obra de Gehad Hajar (e-cultura)