Pular para o conteúdo principal

Prefácio ao livro “Vidas Transitórias” de Ottavio Lourenço

Prefácio

Uma cidade que insiste em ser de clima sorumbático, diversa e atípica – como é Curitiba – serve-se facilmente como cenário à passagens de escritos singulares.
“Vidas Transitórias” é um olhar traçado sobre o limiar do imagético, onde personagens, encontros, lugares, transpõem o sobressalto de fatos que poderiam ficar no esquecimento, para a eternidade de uma narrativa.
Perto da poesia, narrativas com a umidade dos lados do Estribo Ahú e cercanias do Guaíra, entreouvidas nas vozes haitianas e polonesas, onde identifica-se o Ser Comum, destacado por ser alvo de uma crônica, tudo intercalado por deliciosos aforismos do autor que, certamente, em algum tempo serão anexins em rodas de papo na rua XV e mundo afora.
Cada texto deste livro é apontamento d’um momento desses personagens, desses encontros, dessa geoidentidade, que é comum a todas as gentes, anônimas ou não.
Como o momento em que Beauvoir é convidada para uma sessão de estudos no bagunçado quarto do aluno Sartre, e a filosofia não foi mais a mesma. Ou o momento em que Enrico Caruso, destemido, resolve procurar Puccini para ouvi-lo cantar, em sua aldeia toscana, que fez juntar a maior voz com o maior compositor, jamais superados.
No momento que o jovem Tchekhov vai à Yasnaya Polyana, fazenda vizinha à sua, para procurar o famoso velho que se banhava todas as tardes de primavera no lago. Acompanhou da margem o conde Leon Tolstoi. Nunca dois titãs da literatura estiveram tão próximos. E o que dizer da ocasião que Isadora Duncan, a mãe da dança moderna, ouve vaias após um ato de sua apresentação, que são caladas ao levantar da poltrona, em aplauso, nada menos que Stanislavski, convertendo os uivos em aclamação e firmando a dança em seu novo tempo.
Ou da única visita de Isak Dinesen à Nova York, recepcionada em almoço na casa de Carson McCulles, onde a falante Marilyn Monroe, com decotado vestido debruado com pele, contava costumar terminar o macarrão com secador de cabelo, quando atrasava uma recepção em que cozinhava. Uma amizade platônica que aflorou e culminou com a já idosa Isak e Marilyn a dançarem sobre a mesa. 
Este é o ofício de destacar momentos de qualquer pessoa e transformá-los em eterno objeto de ênfase, arte a que dedica este opúsculo. 
A arte do filósofo Ottavio materializa-se tanto nos versos urrados da internacional banda Choke, como em sua lavra literária que o coloca entre a nova geração de autores nativos. “Sombrio e Tropical” e “Contos de Outros Cantos” já se fazem presentes nas estantes da literatura contemporânea.
Uma terra tão distinta, com gente tão plural, faz certeza ao pensamento de Ottavio Lourenço: nós não somos somente um o tempo todo!

Gehad Ismail Hajar

Escritor, pesquisador, produtor e gestor cultural, membro do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná, do Centro de Letras do Paraná, do Círculo de Estudos Bandeirantes, da Academia de Cultura de Curitiba e da Sociedade Brasileira de Heráldica.

Postagens mais visitadas deste blog

Curitiba já foi capital do Brasil e é mais antiga do que se imagina (Matéria do Jornal Comunicação On-line - UFPR)

Pesquisadores revisitam a história da cidade e apontam fatos históricos desconhecidos pela população Reportagem: Felipe Nascimento Edição Renata: Portela Responda a seguinte pergunta: quais cidades foram capitais do Brasil? Um bom estudante de história responderia Salvador, Rio de Janeiro e Brasília. Mas o que poucos sabem é que Curitiba já foi oficialmente capital brasileira. Esse é somente um dos fatos históricos pouco conhecidos sobre a cidade apontados por dois pesquisadores da história do Paraná. Gehad Hajar, membro do Instituto Histórico e Geográfico do Paraná, é um desses pesquisadores.  Ele está realizando a pesquisa “Curitiba: de povoado à capital do Brasil”, que deverá ser lançada em livro no segundo semestre de 2011. A cidade foi capital federal entre 24 e 27 de março de 1969, época em que vigorava a ditadura militar. De acordo com o pesquisador, a mudança foi por uma questão propagandística. “Curitiba era uma das capitais brasileiras que não

Apresentação do livro "Monumentos de Curitiba" - 2° edição

Apresentação Há muito sentia-se falta de um inventário do patrimônio artístico e cultural nos logradouros e próprios públicos do Município de Curitiba.  Ei-lo: Monumentos de Curitiba, nossa pesquisa de mais de uma década, em que corremos a campo, percorrendo ruas, praças e prédios a fim de elencar, catalogar e fotografar as hermas, bustos, placas, monólitos, estátuas, fontes, repuxos, relógios, árvores preservadas, monumentos, obras de arte, enfim, tudo que esteja exposto publicamente e agregue valores culturais e históricos à memória da cidade.  No afã de ajudar em futuros estudos, restaurações, reposições, manutenções e análises, as fichas tendem a trazer informações mínimas, padronizadas e necessárias, acompanhadas de fotos dos principais bens. Nossa coleção pública é valiosa. Temos desde o monólito do séc. XVII de posse portuguesa sobre este território, na praça Tiradentes; a última argola de atracamento de cavalos do séc. XVIII, na rua de São Francisco; o primeiro

Vida e obra de Gehad Hajar (e-cultura)